Discurso de Bolsonaro na ONU em 2021 tem maior índice de reprovação nas redes desde o início de seu mandato

Por Ana Beatriz, Lucas Amorim e Nathália Tavares | Supervisão: Jonatas Varella e Guilherme Russo

Apesar de manter discursos similares nas três ocasiões em que o presidente Bolsonaro discursou na Assembleia Geral da ONU (UNGA), a cada edição sua taxa de aprovação diminui. Se em 2019, período ainda de lua de mel do presidente, 70% aprovaram seu discurso nas redes, agora, em 2021, pela primeira vez foram mais menções negativas do que positivas.

Para analisar de forma comparada o tom dos três discursos proferidos por Bolsonaro ao longo de seu mandato, bem como a receptividade e repercussão de suas falas nas redes sociais, utilizamos a metodologia de construção de nuvem de palavras, identificando os principais termos proferidos pelo presidente, coletando e classificando as menções nas mídias sociais nos dias em que os discursos foram realizados.

UNGA 2019

Em seu primeiro discurso na UNGA, em 2019, o Presidente Jair Bolsonaro apresenta um posicionamento muito bem definido, orientado ao comentário de questões e problemas internos para mobilização do seu eleitorado, além de um alinhamento internacional quase que direto aos Estados Unidos [chegando inclusive a fazer um agradecimento direto ao então Presidente Donald Trump].

Nesse sentido, um dos assuntos que mais se destaca é em relação a abordagem ambiental deste discurso. À época, o Brasil enfrentava fortes críticas acerca do aumento do número de queimadas e destruição na Amazônia e, em um tom quase que de defesa e prestação de contas ao sistema internacional, o presidente utilizou, como demonstra Silva (2020)2, 12 dos seus 32 minutos apenas expondo a política ambiental de seu governo. Abaixo, é possível ver os termos mais empregados no discurso do Presidente na abertura da 74ª Assembleia Geral, em 2019:

Fonte: Quaest

UNGA 2020

Devido a pandemia do Coronavírus, a 75ª sessão da Assembleia Geral, em 2020, foi realizada quase que completamente em formato virtual. Nesta ocasião, o discurso de Jair Bolsonaro, feito em vídeo, durou cerca de 15 minutos, quase metade do tempo do seu primeiro discurso em 2019, e pareceu ter um tom menos agressivo que o primeiro.

De forma específica, o Presidente abordou temas como pandemia, investimentos externos, agronegócio brasileiro e políticas ambientais. No que se refere a crise sanitária, somente o termo “pandemia” aparece com frequência na nuvem de palavras. No discurso, feito em meio a um momento de alta no número de mortos no país, o presidente chegou a afirmar que “não faltaram nos hospitais os meios para atender aos pacientes de COVID”. E assim, como reiterado em ocasiões posteriores, Bolsonaro fez defesa do tratamento precoce, mesmo apesar da falta de evidências científicas.

Fonte: Quaest

UNGA 2021

No discurso deste ano, o presidente tentou vender a ideia de um “novo Brasil” que, segundo ele, é diferente do que é “publicado em jornais ou visto em televisões”. E para endossar a ideia, o presidente priorizou falar de investimentos e contratos privados para investimento em ferrovias e leilões. Ao se referir às pautas ambientais, Bolsonaro convidou líderes mundiais a visitarem a Amazônia e afirmou que o Código Florestal Brasileiro é um exemplo para outros países. Os termos mais utilizados ao tratar deste tema foram “área”, “agricultura”, “Amazônia” e “ambiental”.

Por fim, ao falar sobre a pandemia, o Presidente destacou que seu governo é contra a obrigatoriedade do chamado “passaporte sanitário”, e defendeu mais uma vez o tratamento precoce.

Fonte: Quaest

COMPARATIVO

Em termos gerais, é possível perceber que o discurso do Presidente na UNGA em 2021 traz algumas semelhanças com aqueles apresentados nas duas edições anteriores, em especial, com o discurso do ano passado. Além disso, por meio das nuvens de palavras, é possível notar que termos como “Brasil”, “mundo”, “governo”, “ambiental” e “liberdade” estão muito presentes, repetindo-se nos três discursos. Isso ajuda a compreender uma tendência apontada por alguns analistas, de uma abordagem no discurso mais voltada aos assuntos internos e de política externa, que tem por finalidade agradar e mobilizar o eleitorado de Jair Bolsonaro, do que para as pautas da política internacional.

No mais, é interessante atentar-se à repetição no posicionamento acerca de alguns temas presentes nos três discursos, com trechos inclusive muito parecidas:

MISSÕES DE PAZ e REFÚGIO

– Em 2021, ao falar sobre as missões de paz da ONU e a questão de refugiados, Bolsonaro cita:

“O Brasil sempre participou em missões de paz da ONU de Suez até o Congo, passando por Haiti e Líbano. Nosso país sempre acolheu refugiados, em nossa fronteira com a vizinha Venezuela, a Operação Acolhida do Governo Federal já recebeu 400 mil venezuelanos deslocados devido à crise político-econômica gerada pela ditadura bolivariana.”

– De maneira semelhante, no discurso de 2020, o Presidente descreve que:

“A Operação Acolhida, encabeçada pelo Ministério da Defesa, recebeu quase 400 mil venezuelanos deslocados devido à grave crise político-econômica gerada pela ditadura bolivariana. […]

O Brasil já participou de mais de 50 operações de paz e missões similares, tendo contribuído com mais de 55 mil militares, policiais e civis, com participação marcante em Suez, Angola, Timor Leste, Haiti, Líbano e Congo.”

PANDEMIA

– Em 2020:

“Desde o princípio, alertei, em meu País, que tínhamos dois problemas para resolver: o vírus e o desemprego, e que ambos deveriam ser tratados simultaneamente e com a mesma responsabilidade.”

“Nosso governo, de forma arrojada, implementou várias medidas econômicas que evitaram o mal maior: […] “

“Estimulou, ouvindo profissionais de saúde, o tratamento precoce da doença;”

– Em 2021:

“A pandemia pegou a todos de surpresa em 2020, lamentamos todas as mortes ocorridas no Brasil e no mundo. Sempre defendi combater o vírus e o desemprego de forma simultânea e com a mesma responsabilidade.”

“Desde o início da pandemia, apoiamos a autonomia do médico na busca no tratamento precoce, seguindo recomendação do nosso Conselho Federal de Medicina. Eu mesmo fui um desses que fez tratamento inicial.”

AMAZÔNIA

– Em 2019:

“Em primeiro lugar, meu governo tem um compromisso solene com a preservação do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável em benefício do Brasil e do mundo. O Brasil é um dos países mais ricos em biodiversidade e riquezas minerais. Nossa Amazônia é maior que toda a Europa Ocidental e permanece praticamente intocada. Prova de que somos um dos países que mais protegem o meio ambiente.”

“Problemas qualquer país os têm. Contudo, os ataques sensacionalistas que sofremos por grande parte da mídia internacional devido aos focos de incêndio na Amazônia, despertaram nosso sentimento patriótico.”

– Em 2020:

“Mesmo assim, somos vítimas de uma das mais brutais campanhas de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal.”

“A Amazônia brasileira é sabidamente riquíssima. Isso explica o apoio de instituições internacionais a essa campanha escorada em interesses escusos que se unem a associações brasileiras, aproveitadoras e impatrióticas, com o objetivo de prejudicar o governo e o próprio Brasil.”

“Somos líderes em conservação de florestas tropicais. Temos a matriz energética mais limpa e diversificada do mundo.”

– Em 2021:

“Na Amazônia, tivemos uma redução de 32% do desmatamento no mês de agosto, quando comparado a agosto do ano anterior.”

“Qual o país do mundo tem uma política de preservação ambiental como a nossa?”

“Os senhores estão convidados a visitar a nossa Amazônia. O Brasil já é um exemplo na geração de energia, com 83% advindas de fontes renováveis.”

AMEAÇA SOCIALISTA

– Em 2019:

“Meu país esteve muito próximo do socialismo, o que nos colocou numa situação de corrupção generalizada, grave recessão econômica, altas taxas de criminalidade e de ataques ininterruptos aos valores familiares e religiosos que formam nossas tradições.”

– Em 2021:

“Isso é muito! É uma história da base se levarmos em conta que estávamos à beira do socialismo. Nossas estatais davam prejuízos de bilhões de dólares no passado, hoje são lucrativas.”

METODOLOGIA

Para a análise da repercussão nas mídias sociais, os termos “Bolsonaro” e “Presidente” ligados (ou alguma outra palavra que mostre que esses termos são dependentes) “ONU” e “Discurso” foram utilizados para coletar as menções referentes às datas de 24/09/2019, 22/09/2020 e 21/09/2021 , que correspondem, respectivamente, às participações do presidente nos três últimos anos na Assembleia-Geral da ONU. Posteriormente, as menções foram classificadas a partir de um modelo Bayesiano, que categorizou em “Aprovação” e “Reprovação” do discurso de Bolsonaro. Palavras como “vergonha”, “mentira”, “tristeza”, “vexame” foram utilizados para compor as menções que desaprovam o discurso e termos como “orgulho”, “parabéns”, “herói nacional”, “maravilhoso” compõem os parâmetros de aprovação da fala do presidente brasileiro.

Para a análise dos discursos do presidente de 2019 e 2020 utilizamos a transcrição oficial disponibilizada pelo Planalto na plataforma gov.br3. Já para o discurso de 2021 a transcrição foi feita a partir do vídeo4 disponibilizado pela ONU na íntegra. As transcrições foram submetidas a um tratamento e uma análise de frequência dos termos para a construção das nuvens contendo as palavras mais utilizadas ao longo dos discursos.

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